TEATRO, palavra que soa forte e me impulsiona a viver, e ainda mais por ser farinha de um mesmo saco, farinha de 9 quilos e sete arrobas de combustão. Temos farinha para toda obra e, evidentemente, livres para voar quando e onde quisermos, quem é farinha é forte e não desiste, resiste até o fim, até o fim chegar e o fim chega.
Mas aqui quero falar de meu amor, de meu viver, minha farinha a mais puríssima e a melhor a única. Tantos trabalhos, tantas brigas, tantas raivas, tantas alegrias e conquistas. E briga-se com o ator, diretor, com nós mesmos. E é corpo dolorido, é peito dolorido. Chora-se, perde-se e se ganha muito mais, pois o resultado final sempre vem e, ao contrário de muitos que se realizam com o resultado final nós nos angustiamos muito mais quando o trabalho é bom, porque queremos superar o bom e ir além. Fazemos arte para nós que não vemos quase nunca nada de bom por essas terras, fazemos arte para nosso público que deixa a novela das oito para assistir-nos, para nos dar audiência; teatro é antiguidade mas é novidade, teatro é vivo é cru e nu. Ser ator não é o ato de trabalho somente e sim de necessidade, de veracidade com o seu dever de atuar e o seu compromisso, ser ator é sagrado demais e nada o substitui.
Ser ator é brigar em casa para atuar, é brigar na rua e mostrar que você não é vagabundo, é mostrar todos os dias que somos intelectos de nós mesmos e não devemos nada a ninguém a não ser a nossa personagem que nos suga, ser ator é escrever que não sabe expressar-se “escritamente” e se cagar todo em palavras por que nada o sabe defini-lo. Ser ator é sentir e externar corporalmente em atuação e se mostrar, é suar frio ao escutar MERDA, é delirar ao ver a luz cair e o som aumentar, é gozar ao escutar o aplauso e sentir prazer quando se angustia querendo superar sempre o melhor.
Ser ator é ter farinha no corpo, na alma e no coração cheio de flechas, ter todas as chagas e curar-se a cada dia. Ser ator é ser farinha deste saco imenso que causa inveja e admiração, ser ator é estar todos os dias consagrando esse vício, esse esporro que não alivia. É querer sempre mais e não saciar-se, é amar e envenenar-se.
Ser ator é não ter tempo para o teatro e brigar com todos e ter tempo para o teatro, ser ator é do caralho. Sou eu.
Viva minha farinha, que é pura.
CARLA SOARES